Como outras grandes metrópoles brasileiras, Manaus vem enfrentando uma crise de mobilidade urbana. Entre 2005 e 2009, a frota de veículos motorizados na cidade cresceu 8,8% (SEPLAN), bem acima da média nacional e cerca de cinco vezes maior que o crescimento da população. A expansão do sistema viário não acompanhou este aumento e isto resultou no adensamento e sobrecarga das vias de trânsito, causando engarrafamentos regulares e a insatisfação geral da população. Como na maioria das cidades, o governo municipal tem priorizado investimentos em infra-estrutura para transporte coletivo e para veículos motorizados individuais e investido muito pouco em infra-estrutura para pedestres e ciclistas.

O Ministério das Cidades (2007) estima que a média de deslocamentos a pé e bicicleta nos centros urbanos de Brasil seja 34% e 3%, respectivamente. O panorama geral do Brasil é de carência de calçadas e ciclovias, porém esses valores poderiam aumentar significativamente caso houvesse maior investimento neste tipo de infra-estrutura urbana. Estudos revelam que historicamente a população que pedala é composta predominantemente de pessoas de baixa renda que escolhem estes modos de transporte por razões econômicas. No caso de ciclistas no Brasil, 72% ganha entre nenhum e três salários mínimos. Eles usam a bicicleta predominantemente como meio de transporte entre a casa e o local de trabalho porque não têm como custear o uso de transporte público. Encontramos estes ciclistas diariamente nas ruas de Manaus, competindo com os carros e ônibus no congestionado espaço viário. Outra parte significativa da população manauara utiliza a bicicleta como transporte por escolha pessoal ou como lazer e esporte. Estes são estudantes, universitários, empregados, professores, esportistas, turistas, homens, mulheres, crianças e senhores. Todos se beneficiariam de imediato de uma rede de ciclovias, assim como a economia de Manaus.

O Brasil é o terceiro produtor mundial de bicicletas, responsável por cerca de 5% desta produção, e tem a sexta frota do planeta, com 75 milhões de unidades. Manaus abriga no Distrito Industrial o Pólo de Duas Rodas que contribui diretamente com grandes fábricas, das quais a Caloi se destaca, produzindo milhões de novas bicicletas e peças todo ano. Se houvesse uma rede de ciclovias em Manaus que permitisse pedalar com segurança entre os principais bairros, essas bicicletas poderiam ser melhor aproveitadas pela população local em vez de serem apenas exportadas.

O tamanho da população de ciclistas em Manaus ainda não foi estimado, embora deva haver milhares de ciclistas transitando diariamente pelas ruas e avenidas. Porém, considerando os riscos que o ciclista assume hoje no caótico transito municipal, é muito provável que a população de ciclistas seja muito maior se tivermos uma rede de ciclovias seguras. Em todas as cidades do mundo que implementaram, ou estão implementando redes de ciclovias, o principal consenso e motivo para investir é sempre aumentar a segurança dos ciclistas. O investimento nesta rede em Manaus promoveria a inclusão social, viabilizando a mobilidade da camada mais carente da população.

Os ciclistas em Manaus enfrentam riscos para pedalar nas principais vias urbanas.

Além de promover mobilidade e reduzir a exclusão social, o investimento em ciclovias também contribui para a sustentabilidade ambiental. Mais que 80% da população no Brasil e 50% do mundo hoje vivem em áreas urbanas. A queima de combustíveis fósseis por carros, ônibus e caminhões nas cidades polui a atmosfera local, aumentando os índices de doenças respiratórias e a contaminação do solo e água por metais pesados. As emissões agregadas de CO2, metano e N20, derivados do setor de transporte em todas as cidades, também contribuem para o aquecimento global, que pode causar mudanças grandes no clima da Amazônia com consequências graves para Manaus e o estado do Amazonas (Nobre 2001). A promoção do uso de meios de transporte não-motorizados, como a bicicleta, a partir da construção de uma rede de ciclovias, poderia reduzir significativamente as emissões de CO2, CH4 e N2O da cidade de Manaus, reduzindo tanto a poluição local quanto a contribuição da cidade para o aquecimento global. Se esta redução fosse significativa, ela poderia ser negociada para créditos ou offsets de carbono, que podem financiar, em parte, a construção destas ciclovias.

A construção de uma rede de ciclovias pode trazer uma série de benefícios para a cidade de Manaus, aumentando a mobilidade e a inclusão social e contribuindo para a sustentabilidade ambiental. Em cidades como Amsterdam, Bogotá, Paris, Seattle e Brasília, que construíram ou estão construindo grandes redes de ciclovias, estes sistemas cicloviários se tornaram símbolos de uma mudança maior, onde a cidade é criada para pessoas e onde todas usufruem igualmente da infra-estrutura urbana. Com a chegada da Copa em 2014, uma rede de ciclovias, integrada a um novo sistema de transporte coletivo, também seria simbólico de uma Manaus moderna, sustentável e socialmente justa, com custo de implementação baixo em relação a outras opções de transporte.

Segundo um levantamento preliminar feito pelo movimento Pedala Manaus, 94% dos 124 ciclistas sondados disseram que usariam mais a bicicleta caso houvesse ciclovias em Manaus, uma vez que o trânsito é muito perigoso. Trinta e cinco por cento destas pessoas utilizavam a bicicleta principalmente aos finais de semana. Porém mais de 20% a utilizavam todos os dias para ir ao trabalho. Fazer exercícios é uma forma de combater a obesidade e evitar doenças cardíacas. Pedalar também é muito saudável e acessível para as pessoas: 69% dos ciclistas sondados gostavam de usar a bicicleta como esporte. Dessa forma, a implantação de um sistema de ciclovias em Manaus será de grande interesse para a saúde pública, já que ele facilitará e promoverá o uso de bicicleta para exercício físico, esporte e lazer na cidade. O sistema também será de interesse de vários outros órgãos, como SEMMAS, IMTT, SEMINF e DETRAN, porque as ciclovias, se bem planejadas, ajudarão a desafogar o trânsito na cidade e a melhorar a qualidade ambiental urbana. Esse benefício é refletido na opinião dos manauaras: 31% usam a bike para reduzir o trânsito, 23% porque o transporte público é ruim e 36% para reduzir emissão de gases poluentes.

Referências

Ministério das Cidades. Plano de mobilidade por bicicleta nas cidades. Coleção Bicicleta Brasil, Caderna 1. Ministério das Cidades – Secretaria Nacional de Transporte e da Mobilidade Urbana. Brasília, DF, 232 p., 2007.

NOBRE, C.A. Mudanças climáticas globais: possíveis impactos nos ecossistemas do país. Parcerias Estratégicas, n. 12, p. 239-258, 2001.