Em defesa da bicicleta como meio de transporte

Vivemos em uma sociedade que cultivou o hábito de ver o automóvel como um símbolo de status, ignorando o papel do ciclista na mobilidade urbana. Porém, a utilização da bicicleta como meio de transporte envolve uma grande melhoria na qualidade de vida, reduzindo a poluição e emissão de ruídos, promovendo a inclusão social, minimizando custos de mobilidade, garantindo maior fluidez no trânsito, prezando pela saúde do meio ambiente e pelo bem-estar das pessoas. Segundo um estudo recente da NASA, veículos motorizados estão entre os maiores responsáveis pela emissão de gases associados às alterações climáticas em todo o planeta. Usar o carro em demasia pode ser tão ruim quanto destruir a floresta. Mas se pedalar traz tantos benefícios, por que então as pessoas não utilizam mais as bicicletas como meio de transporte?

 

A falta de segurança limita o uso da bicicleta em Manaus

É triste perceber que muitas bicicletas estão enferrujando na garagem pelo receio que se tem de sofrer um acidente nas vias repletas de carros, caminhões e ônibus. A verdade é que centenas de pessoas que residem em Manaus não pedalam mais porque não existe um planejamento viário mínimo que permita o deslocamento de ciclistas com segurança e conforto.

O Brasil é o terceiro produtor mundial de bicicletas, responsável por cerca de 5% da produção mundial, e tem a sexta frota do planeta, com 75 milhões de unidades. Manaus abriga no Distrito Industrial o Pólo de Duas Rodas que contribui diretamente com grandes fábricas, das quais a Caloi se destaca, produzindo milhões de novas bicicletas e peças todo ano. Isso acaba sendo um contra-senso, pois a cidade não possui infraestrutura nenhuma que permita pedalar com segurança entre os principais bairros. E parece que a situação de Manaus é regra, não exceção. O Ministério das Cidades realizou uma pesquisa que abrangeu mais de 400 municípios sobre infra-estrutura para bicicletas no Brasil, chegando a aproximadamente 2.500 km de vias cicláveis. Ainda que essa seja uma subestimativa, é nítida a falta de investimentos na bicicleta como alternativa na matriz de transporte. A Holanda, por exemplo, tem cerca do dobro da área do estado de Sergipe, o menor estado do Brasil, mas tem mais de 18.000 km de infraestrutura cicloviária em suas cidades!

Sabendo dos benefícios associados à bicicleta, nossa proposta é reverter essa situação, através da organização, planejamento de ações e mobilização dos usuários de bicicleta em Manaus. Dentro e fora do Brasil, o uso deste meio de transporte está sendo fomentado em cidades como São Paulo, Madri, Santiago do Chile, Pittsburgh e Lisboa, mas já está relativamente bem estabelecido em outras, como Barcelona, Copenhague, Rio de Janeiro, Amsterdam, Paris, Bogotá, Munique, Berlim e Hamburgo. Sem exceção, o uso popular da bicicleta está associado a diversos benefícios sociais e ambientais, oferecendo um mercado de produtos e serviços ainda pouco explorado no Brasil. Reconhecida como o transporte ecologicamente mais sustentável do planeta pela Organização das Nações Unidas (ONU), pela Conferência das Nações Unidas para o Ambiente e Desenvolvimento (ECO-92) e pela Agenda 21, a bicicleta oferece uma alternativa democrática, barata e eficiente para a mobilidade urbana em todo o planeta.

No âmbito nacional, historicamente poucos recursos foram investidos em infra-estrutura para a bicicleta nas cidades brasileiras. Contudo, o panorama atual reflete uma melhora em potencial nos sistemas de transporte urbano através do uso da bicicleta. Já em 1976, a Empresa Brasileira de Planejamento de Transportes (GEIPOT) compilou o conhecimento de algumas iniciativas em curso no manual Planejamento Cicloviário – Uma Política para as Bicicletas. Na década de 80, muitas cidades realizaram planos diretores de transportes urbanos que incluíam estudos e projetos voltados à melhoria das condições de circulação e segurança de ciclistas. Antes de ser extinto, o GEIPOT consolidou a publicação Planejamento Cicloviário – Diagnóstico Nacional e Manual de Planejamento Cicloviário sobre o uso, a infra-estrutura, os procedimentos e os resultados favoráveis à bicicleta em 60 municípios, assim como normas, regras e exemplos de técnicas para a construção de infra-estrutura em áreas urbanas. Em vigor desde 1998, o Código de Trânsito Brasileiro (Lei 9.503/1997) incluiu pela primeira vez regras de condução da bicicleta, regras para organização da sinalização voltada aos ciclistas, limitações aos veículos motorizados e outras normas de comportamento para o uso das vias públicas que visam favorecer o uso da bicicleta em todo o território brasileiro. Com planos de difundir a cultura da bicicleta no país, o governo federal lançou em 2004 o Caderno de Referência para elaboração de Plano de Mobilidade por Bicicleta nas Cidades, fornecendo subsídios importantes para desenvolver uma proposta de mobilidade urbana que priorize a circulação de ciclistas e a integração com o sistema de transporte. Assim, hoje o Brasil possui um programa específico para a bicicleta que tem o potencial de catalisar o desenvolvimento de projetos viários que contemplem o uso da bicicleta como meio de transporte.

A Copa de 2014 é a oportunidade de promover o uso da bicicleta

Considerando esse contexto, o cenário atual se apresenta como ideal para favorecer a conscientização da sociedade manauara sobre os direitos do ciclista, mas ganha ainda maior apelo se considerarmos a mobilização que a Copa de 2014 vai trazer ao país. Para o Brasil, é a oportunidade de modernizar suas cidades, captar investimentos e oferecer atrativos únicos que podem transformar o país em um dos mais importantes destinos turísticos do mundo. Manaus será a porta de entrada. Todos estarão de olhos bem abertos para ver a Amazônia, verdinha, imensa, repleta de vida e dona de uma diversidade cultural, étnica e biológica inigualáveis. Essa é uma grande responsabilidade e exige um comprometimento contínuo das três esferas do governo em atender as demandas da sociedade e atuar para modernizar as áreas urbanas em benefício da qualidade de vida dos cidadãos e turistas que irão pousar em território Baré.

O movimento Pedala Manaus surge então para atender a essa demanda coordenando ações que pretendem ajudar a promover a utilização da bicicleta como meio de transporte em Manaus. O movimento visa agregar todos os usuários em potencial, contando com a participação de ciclistas, universitários, estudantes, pesquisadores ligados à área ambiental e social, industriários, comerciantes, empresários, funcionários públicos e políticos. Os primeiros passos foram dados com a estruturação do blog Pedala Manaus! (pedalamanaus.blogspot.com), que favoreceu a interação das pessoas e a organização de ações. O movimento cresceu e está conquistando apoio popular, político e privado e desde 2011 agrega suas conquistas, ações e discussões no site http://pedalamanaus.org/.

Propostas do Pedala Manaus!

  • reunir os usuários em potencial de um sistema cicloviário em Manaus, cobrindo todas as classes sociais e bairros
  • organizar passeios ciclísticos para promover a conscientização da bicicleta como meio de transporte
  • realizar pesquisas básicas sobre o fluxo de bikes
  • realizar entrevistas para traçar o perfil dos usuários de bicicletas
  • ajudar a planejar um sistema cicloviário para Manaus, contemplando infraestrutura, medidas educacionais e integração com transporte coletivo
  • promover campanhas com fins educativos sobre os direitos e deveres do ciclista
  • promover ações voltadas à ampliação do uso da bicicleta
  • gerar um mapa para o ciclista urbano com rotas cicloviárias
  • divulgar ações na mídia, usando internet, jornais impressos, rádio e televisão